15-02-2010


14-05-2013


O trabalho profissional exercido em organizações de Terceiro Sector (welfare mixes) ganha especial relevância e actualidade face à complexidade dos problemas sociais que aquelas são solicitadas a responder e à constatação de novas formas de organização do trabalho, no quadro de uma sociedade do conhecimento, o que potencia um acréscimo de reflexividade social na realização de finalidades de interesse público. Em Portugal, o desenvolvimento significativo de organizações direccionadas para a intervenção social tem-se manifestado na criação de organizações associativas, a nível local e regional, abertas à personalização, à participação, à co-decisão e ao apoio aos grupos sociais desfavorecidos, embora sua sustentabilidade não seja consensual. Em consonância, estas organizações estão mais próximas dos cidadãos e, por isso, estão melhor posicionadas para encontrarem processos e soluções menos padronizados e mais flexíveis para os problemas sociais, bem como formas não burocráticas de prestação de serviços aos utentes mais sensíveis à sua heterogeneidade social e cultural. Esta situação tem conduzido a um cada vez maior financiamento por parte do Estado, no pressuposto do aumento de qualidade e efectividade na realização das políticas públicas.\nPorém, esta dependência das organizações do Terceiro Sector face ao Estado é vista, por vezes, como uma tentativa de desresponsabilização do Estado relativamente à qualidade e universalidade dos serviços sociais prestados, a que não são alheios os problemas actuais de financiamento devido ao desemprego estrutural, às tendências do fenómeno demográfico e à competitividade da economia global, e cuja resposta tem sido encontrada em medidas de tipo neo-liberal, com a consequente externalização dos serviços públicos para o Terceiro Sector e com a erosão do capital simbólico do trabalho profissional associado à precarização dos seus vínculos laborais.\nAssim, o trabalho profissional nas organizações do Terceiro Sector desenvolve-se em actividade por projectos, sob a imposição de parcerias com o sector público, e no quadro de processos de desregulação social e simbólica das instituições sociais. Estas condições obrigam os profissionais a saber lidar com elevados níveis de incerteza quanto ao diagnóstico dos problemas e aos efeitos das intervenções sociais. Estes profissionais, detentores de uma educação formal superior e de um perfil de polivalência - centrado nas Ciências Sociais e Humanas - associado a novas áreas de profissionalização, mobilizam conhecimento e sistemas de valores que são sujeitos a um controlo público à distância quanto à efectividade da prestação dos serviços. Trata-se, na maioria dos casos, de um trabalho profissional assalariado, muitas vezes em regime de prestação de serviços, que se concretiza (em maior ou menor grau, conforme as profissões em causa) em actividades de cariz reflexivo: numa actividade reflexivo-discursiva de implementação dos dispositivos das políticas públicas e numa actividade reflexivo-prático de "resolução de problemas" em situação com os utentes dos serviços. \nO desenvolvimento destas duas dimensões reflexivas do trabalho profissional carece de formas de trabalho - e consequentemente de formas de recolha de dados - que sejam estimuladoras da explicitação e da formalização da consciência prático-experiencial e da capacidade crítica para recontextualizar os princípios e valores gerais das políticas públicas na interacção social. \nNeste contexto, propomo-nos desenvolver uma estratégia etnográfica de recolha e análise de dados sobre o saber e as competências profissionais que evidencie a subjectivização e a inteligibilidade que o trabalho tem, na interacção social, para o próprio profissional, com base numa auto-descrição detalhada e pormenorizada da sua actividade e numa auto-reflexão sobre aspectos observados da sua actividade pelo investigador. Importará, ainda, entender quais as condições sócio-organizacionais existentes no Terceiro Sector que são facilitadoras ou inibidoras das (des)continuidades entre as competências reflexivo-discursivas e as reflexivo-práticas uma vez que se sabe que ambas têm epistemologias diferenciadas - portanto, formas de mobilização do conhecimento também diversas - e, por isso, a reflexividade de um tipo não implica necessariamente o desenvolvimento do outro. Para este efeito, serão realizados inquéritos sobre o poder e a autonomia que, no plano simbólico, técnico e político, os profissionais possuem em contexto de trabalho e que lhes permite desenvolver os seus saberes e, em consequência, as competências reflexivas identificadas.\nUm melhor conhecimento sobre o modo como competências, saberes e autonomias podem ser equacionados no trabalho profissional dará preciosas contribuições para que as instituições de ensino superior possam conceber melhores planos e estratégias curriculares para os cursos em que se baseia o trabalho profissional.


FCT Fundação para Ciência e Tecnologia
PTDC/CS-SOC/098459/2008


CIIE / Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP) - Portugal
Centro de Estudos Transdisciplinares para o Desenvolvimento - Portugal
Centro de Investigação em Ciências Sociais - Universidade do Minho - Portugal
Núcleo Interdisciplinar de Estudos sobre Desigualdade (NIED) - Brasil
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) - Portugal
Universidade do Minho (UM) - Portugal

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